07/06/2010

Ex-guerrilheiro do Araguaia hoje é médico em Mossoró

Publicação: 06 de Junho de 2010 às 00:00

Por Esdras Marchezan - De Fato

Poucos sabem, mas um pedaço da história da sangrenta guerrilha do Araguaia hoje mora em Mossoró. Com suas lembranças e fantasmas. Na pequena Clínica da Dor, na rua Melo Franco, onde hoje é médico e atende pacientes que sofrem com dores físicas, o ex-guerrilheiro José Carlos Campos Wisnesky, 66 anos, leva uma vida simples e tenta encontrar uma cura para a dor que lhe acompanha desde a década de 70: a emocional. “Paulo Paquetá” – codinome usado na época de militância pelo PC do B – é considerado desertor por alguns ex-companheiros e pelo partido por ter saído da luta armada contra o regime militar. Hoje ele apoia o trabalho do Grupo de Trabalho Tocantins (GTT), formado em 2009 pelo Ministério da Defesa para encontrar, identificar e devolver as ossadas dos desaparecidos na guerrilha às suas famílias.

No início de maio José Carlos voltou ao Pará após 37 anos para ajudar na identificação de alguns dos mortos esquecidos no Araguaia. Um dos reconhecidos por ele foi o ex-deputado Maurício Grabois, o Mário, que liderava a guerrilha e foi morto em 1973.

Em entrevista ao jornal Correio do Tocantins, João Carlos rebateu as acusações de ‘traição’ e disse que a saída da luta armada aconteceu num momento em que não concordava com o que estava sendo feito pelo comando do movimento. “O partido abandonou todos os guerrilheiros, os vivos e os mortos. Quando cheguei na região, em outubro de 1971, achei tudo muito estranho. Como fazer um exército popular se não podíamos nos comunicar com a população? Falei isso a eles e não me responderam”, disse.

Quando decidiu abandonar a luta armada e voltar a Faculdade de Medicina, no Rio de Janeiro, João Carlos procurou por diversos companheiros do partido, mas eles estavam presos ou mortos. Decidiu largar o movimento. Meses depois os militares mataram quase todos os comunistas que participavam da guerrilha. Os corpos de muitos não foram encontrados até hoje. Uma das pessoas desaparecidas até hoje é a companheira de João Carlos, Maria Célia Correa, a Rosa, convencida por João Carlos a participar da luta armada.

Sua fuga começou a se esboçar quando os guerrilheiros do destacamento A, do qual fazia parte, foram à Transamazônica atacar um posto policial em setembro de 1973. Paulo não foi chamado. Com Hélio Navarro de Magalhães, o Edinho, hoje desaparecido, e três rapazes do Araguaia que aderiram à guerrilha, foi para outra área. “Ia de batedor. Chegamos a uma roça. Edinho me mandou atravessar com cautela. Cheguei lá, mas eles, não. Fiquei três dias parado. Ficou claro que havia sido abandonado. Decidi voltar ao Rio.”, disse em entrevista a Folha de São Paulo, em abril. Nessa época ele já não estava mais com a companheira Rosa.

No Relatório Arroyo, em que o PC do B analisa a guerrilha, Paulo é tido como desertor. O ex-deputado Aldo Arantes, representante da sigla no GTT, não comentou a ajuda de Wisnesky quando procurado, pela Folha de São Paulo. Renato Rabelo, presidente do partido, não quis falar.